quarta-feira, 23 de março de 2011

O silêncio como forma de censura

Em debate recente cujo tema foi "Censura e liberdade de expressão: por uma outra mídia", promovido pela Secretaria de Audiovisual do Mininstério da Cultura e pelo programa de pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal Fluminense, realizado no Rio de Janeiro, tentei argumentar que, contrariamente ao "eixo discursivo" dominante na grande mídia, o Estado não é o único censor e, muitas vezes, nem sequer o mais importante. Existem várias formas de censura e, por óbvio, diferentes censores.

Estamos nos referindo à censura da palavra, da expressão que é um direito humano fundamental da pessoa, do indivíduo, do cidadão. Esta censura é anterior à existência não só de Gutenberg – vale dizer, da possibilidade de se imprimir – como é muito anterior à existência da instituição que passou a ser conhecida como "imprensa" e hoje chamamos de "mídia".

A "cultura do silêncio"

No Brasil, onde a "imprensa" tardia chegou somente no século 19, lembrei-me de trecho conhecido do Padre Antonio Vieira que, em sermão pronunciado na Bahia, ainda em 1640, afirmava:

"Bem sabem os que sabem a língua latina, que esta palavra – infans, infante – quer dizer o que não fala. Neste estado estava o menino Batista, quando a Senhora o visitou, e neste permaneceu o Brasil muitos anos, que foi, a meu ver, a maior ocasião de seus males. Como o doente não pode falar, toda a outra conjectura dificulta muito a medicina. (...) O pior acidente que teve o Brasil em sua enfermidade foi o tolher-se-lhe a fala: muitas vezes se quis queixar justamente, muitas vezes quis pedir o remédio de seus males, mas sempre lhe afogou as palavras na garganta, ou o respeito, ou a violência; e se alguma vez chegou algum gemido aos ouvidos de quem o devera remediar, chegaram também as vozes do poder, e venceram os clamores da razão".

Apoiado neste diagnóstico precoce de Vieira, o educador Paulo Freire, em vários de seus escritos, fala da nossa herança colonial de "mutismo" e mais tarde da "cultura do silêncio" dos oprimidos, impedidos de ter voz, mergulhados na submissão pelo silêncio (cf. Venício A. de Lima; Comunicação e Cultura: as idéias de Paulo Freire; Paz e Terra, 2ª. ed., 1984).

Não seria essa uma forma histórica de censura na medida em que a "cultura do silêncio" nega a boa parte da população sua liberdade fundamental de palavra, de se expressar? E quem seria, neste caso, o censor?

No Brasil colonial, certamente o Estado português e os muitos aliados que se beneficiavam da opressão aos povos nativos e aos escravos africanos. A própria sociedade era também "censora", na medida em que convivia culturalmente com a exclusão de vários segmentos de qualquer participação civil. Por exemplo, as mulheres.

Silêncio como censura

Nada disso é novidade, mas certamente ajudará, sobretudo aos jovens de uma sociedade onde nascem novas formas interativas de comunicação – as TICs – a compreender a verdadeira dimensão de conceitos como censura e liberdade de expressão.

Nessa nova sociedade-rede, uma forma disfarçada de censura é o silêncio da grande mídia em relação a determinados temas. Considerando que a grande mídia ainda é a principal mediadora e construtora dos espaços públicos, um tema deliberadamente omitido está sendo sonegado e excluído desse espaço, vale dizer, da possibilidade de fazer parte do conhecimento e do debate público.

Um exemplo recente dessa censura disfarçada foi o silêncio sobre as manifestações populares que mobilizaram centenas de milhares de pessoas por várias semanas em Madison, a capital do importante estado americano de Wisconsin (ver aqui matéria do New York Times).

Ao mesmo tempo em que sociedades autoritárias explodem no Oriente Médio, fruto de mobilizações populares – com ampla, mas seletiva, cobertura da grande mídia ocidental –, trava-se na mais poderosa democracia do mundo a primeira de uma série anunciada de batalhas entre sindicatos de trabalhadores do serviço público e governos estaduais. Os próximos estados serão Ohio, Michigan, Iowa e Indiana.

Está em jogo não só o poder de barganha desses sindicatos, como o valor das aposentadorias e seus planos de saúde. Na verdade, a corda está arrebentando do lado dos trabalhadores e eles estão reagindo. Não se sabe até onde a resistência sindical conseguirá envolver e mobilizar também outros setores da sociedade que sofrem as conseqüências da crise econômica de 2008. E, menos ainda, quais conseqüências essas mobilizações poderão produzir não só nos EUA como em outros países.

Você leitor(a), conhece a cobertura que essas manifestações mereceram na grande mídia brasileira?

Censura x liberdade de expressão x liberdade de imprensa

A discussão de temas como censura, liberdade de expressão e liberdade de imprensa é sempre oportuna entre nós. O historiador Aloysio Castelo de Carvalho no seu A Rede da Democracia (NitPress/Editora da UFF, 2010) – onde fica demonstrado o conluio dos jornais O Globo, O Jornal e Jornal do Brasil, unidos para derrubar o governo democrático de João Goulart, em 1964 – adverte:

"A liberdade de imprensa é um eixo discursivo dos jornais quando eles querem se valorizar como único canal de expressão da opinião pública".

As novas gerações precisam conhecer a história da censura no Brasil e incluir aí não só a censura exercida pelo Estado, mas outras formas de censura: aquela que vem de nossa herança colonial de "cultura do silêncio" e também a censura disfarçada exercida pelo silêncio deliberado em relação a certos temas, pratica rotineira na grande mídia.

Por Venício A. de Lima no Observatório da Imprensa

A aposta errada de Kassab

Onde foi que o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, errou, para saltar praticamente sozinho de um DEM em extinção? O primeiro grande erro talvez tenha sido o de subestimar o fator ideológico, na articulação de uma saída política para si mesmo, mas que pudesse catalisar também parcelas do DEM que tentam sobreviver ao efeito Lula sobre o eleitorado de baixa renda, principalmente nos Estados mais pobres. O segundo, o de superestimar o poder de atração de sua liderança, num partido de cobras criadas, acostumadas a articulações de bastidores e na arte da sobrevivência.

Errou também na tática para arregimentação dos desvalidos políticos do seu e de outros partidos, quando passou a publicizar reuniões supostamente secretas com dirigentes de partidos políticos das mais variadas colorações, e das quais "vazava" acirrado interesse pela sua adesão. Os balões de ensaio afunilaram na opção PSB, pela via de um Partido Democrático Brasileiro (PDB), também publicizado como uma legenda de ocasião, capaz de levar o grupo à adesão ao partido socialista sem o risco de incorrer nos rigores da lei de fidelidade partidária.

O caminho de Kassab seria lógico se não existisse uma hegemonia do grupo do governador Geraldo Alckmin no PSDB paulista, e se o ex-governador José Serra não tivesse sofrido tamanho desgaste interno com a segunda derrota numa disputa pelas eleições presidenciais. Kassab é Serra, simplesmente isso. A complicação que se armou a partir disso foi dada pelas urnas e pelos conflitos que Serra provocou, ou não soube evitar, durante a campanha eleitoral, com integrantes de seu partido e com os aliados do DEM.

O caminho do Kassab em direção ao PSDB, no entanto, foi obstruído por uma contingência regional - a hegemonia de Alckmin em São Paulo - que afeta o prefeito diretamente, e uma contingência nacional - a inegável conquista de espaço pelo senador Aécio Neves, talvez não ainda por mérito próprio, mas pelos conflitos internos irrompidos durante a campanha de Serra. Um Kassab cujo destino político naturalmente tenderia a uma incorporação ao PSDB, que teria resistências muito menores por parte do DEM nacional, acabou envolvido numa missão política de afastar o DEM "aecista" de um PSDB nacional cada vez mais "aecista", e de um PSDB paulista "alckmista" e, em consequência, também "aecista". Pode ter conseguido exatamente o contrário: aproximar ainda mais as lideranças demistas do PSDB de Aécio Neves. Se houver uma incorporação do DEM ao PSDB, agora, será um movimento em torno da liderança do ex-governador mineiro.

A ginástica feita por Kassab para viabilizar-se na política produziu tantos efeitos colaterais que dificilmente o favorecerão, nacionalmente ou regionalmente. Kassab prosperou junto ao eleitorado conservador, aliado a um PSDB que conquistava cada vez mais essa faixa do eleitorado. Venceu as eleições para a prefeitura no auge de popularidade de Serra, a quem sucedeu, como vice, na prefeitura, e de quem teve o apoio, como governador, quando disputou a reeleição para a prefeitura, em 2008.

Funcionou, todavia, como uma "sublegenda" serrista do PSDB, mais do que como uma liderança do DEM. O DEM paulista tem dificuldade de existir sem o PSDB, porque o partido de Alckmin é hegemônico no Estado e conta com a lealdade dos setores de classe média mais conservadores, com peso eleitoral importante. Serra, todavia, parece ter sido rapidamente varrido do mapa partidário do Estado após a sua derrota nas eleições presidenciais e a vitória de Alckmin para o governo do Estado.

Alckmin, que tinha a maioria dos diretórios do interior, mas não desfrutava nem de maioria, nem de prestígio, no diretório da capital, conseguiu movimentar-se rapidamente e hoje domina o partido em todo o Estado. Numa convenção nacional para escolher um candidato tucano para presidente, em 2014, seria voto certo para Aécio. Kassab, sem o padrinho Serra, perde o poder de rachar o PSDB paulistano, façanha que conseguiu em 2008, e não tem nenhum poder de negociação com o PSDB paulista, onde Alckmin reina sem concorrentes.

A "guinada" à esquerda, tentada na negociação de adesão ao PSB, com uma baldeação pelo PDB, é uma tentativa de conquistar outro eleitorado, na impossibilidade de concorrer com o PSDB pelos votos conservadores de São Paulo. Mas, nacionalmente, afugentou os integrantes de um partido que, embora tradicional, tem um conteúdo ideológico já solidificado e nenhuma vergonha de ser de direita. Em vez de ver o PDB como uma opção à extinção, os políticos demistas que poderiam fechar com Kassab passaram a vê-lo como um risco maior.

A senadora Kátia Abreu (TO), por exemplo, embora tenha sérios problemas políticos no seu Estado, é uma liderança conservadora importante, o que atraiu eleitorado correspondente. Uma pessoa com a biografia do ex-senador Marco Maciel (PE) também ficaria incomodado com o futuro anunciado para o PDB, o PSB, até porque é adversário local do presidente do partido socialista, o governador Eduardo Campos. Uma opção de adesão ao governo, ou ao socialismo, também não atrai um político com o passado do ex-senador Jorge Bornhausen (SC).

Pode parecer meio esquisito, mas é por estar na órbita de influência de Serra que Kassab achou que o caminho mais fácil era aderir a um partido da base governista, e de esquerda. Pensou paulista, quando o DEM apostava que despontaria como uma liderança nacional.

Por
Maria Inês Nassif, publicado no jornal Valor Econômico

Sobre a visita de Mr. Obama

Mr. Obama aterrisou no Brasil cheio de simpatia. Afinal, boa parte da população brasileira ainda não está informada de que o eleitorado americano foi vítima de um embuste, e a grande imprensa fez tudo a seu alcance para promover a simpatia do casal e o charme de Mrs. Michele.

A grande mídia não mediu esforços para encobrir a grave crise econômica e social que assola aquele grande país, omitir a manutenção da mesma política externa que levou os Estados Unidos ao atoleiro do Afeganistão e do Iraque, e encobrir o apoio do governo norte-americano aos governos ditatoriais da África do Norte e da Arábia.

Em resumo, fez de tudo para dourar a pílula do que deseja realmente Mr. Obama em sua viagem ao Brasil. E tem sido incapaz de mostrar sua afronta ao Brasil, tipo Bush filho, ao ordenar o bombardeamento da Líbia em seu primeiro dia de visita ao governo brasileiro.

Apesar de falar em paz e cooperação, Mr. Obama demonstrou que pratica guerra e imposição. Embora tenha dito ter apreço pela pretensão brasileira de participar do Conselho de Segurança da ONU, não avançou um til sequer na promessa vaga de continuar trabalhando com todos pela reforma daquele órgão multilateral. E não deu qualquer sinal de que afrouxará as barreiras à entrada dos produtos brasileiros no mercado estadonidense.

Em outras palavras, Mr. Obama esbanjou simpatia, tanto a própria quanto a fabricada, mas não se mostrou disposto a pagar nem um cafezinho. Isso não acontece por acaso. Já antes da catástrofe que assola o Japão, os Estados Unidos enfrentavam uma crescente dificuldade para colocar seus bônus do Tesouro, indispensáveis para financiar seus diferentes déficits e para salvar seus bancos da bancarrota.

O Japão interrompera a aquisição daqueles títulos, a China procurava outras formas de aplicar seus excedentes financeiros, os países árabes produtores de petróleo se resguardavam diante dos levantes populares, e até a Grã-Bretanha, fiel aliada dos EUA, se via obrigada a direcionar seus recursos financeiros para pagar a dívida pública. Diante desses movimentos, o FED já se via constrangido a comprar mais de 70% das emissões dos bônus de seu próprio Tesouro.

A tríplice catástrofe que se abateu sobre o povo japonês pressionará o governo do Japão a despejar seus recursos financeiros na reconstrução das regiões destruídas, na adoção de medidas radicais para substituir alimentos e outros bens contaminados pelas radiações nucleares, e na reativação da economia japonesa. Nessas condições, o Japão pode se transformar de grande comprador de bônus do Tesouro americano em vendedor desses bônus no mercado internacional. Combinada aos demais fatores que já afetavam o mercado desses títulos, a situação japonesa pode representar um golpe destruidor sobre o principal mecanismo utilizado pelos Estados Unidos para financiar a continuidade de sua economia.

Nessas condições, será muito difícil ao governo de Mr. Obama tratar adequadamente seus débitos internos e internacionais, manter suas taxas de juros no atual patamar próximo de zero, utilizar eficientemente a desvalorização do dólar como fator de elevação da competitividade de seus produtos e de reativação de sua economia, e resolver a favor dos Democratas a disputa fratricida que estão mantendo com os radicais Republicanos. Na verdade, o We Can de Mr. Obama está se tornando, cada vez mais, em We Cannot. Afinal, não é preciso ser um analista arguto para notar que nenhum de seus compromissos eleitorais foi cumprido.

Para agravar o quadro geral da crise norte-americana, a decisão do governo Obama de estimular seus aliados sauditas e de outros países árabes a intervir no Bahrein e reprimir as manifestações populares dos povos árabes por melhores condições de vida, reformas democráticas e soberania nacional, já representavam medidas perigosas que podiam tornar ainda mais caótica a situação das regiões do Norte da África e da Península Arábica, tanto do ponto de vista político, quanto social e econômica. O que, inevitavelmente, rebaterá desfavoravelmente sobre a crise norte-americana.

A decisão, em conjunto com a França, Inglaterra e Itália, de intervir nos negócios internos da Líbia, com pretextos idênticos aos utilizados no Afeganistão e no Iraque, pode agravar ainda mais, exponencialmente, todos os fatores de instabilidade e caos presentes no cenário mundial e no cenário interno americano, a começar pelo potencial fator de elevação do preço do petróleo, a principal fonte energética da economia dos Estados Unidos.

Mas podemos agregar a tudo isso outros fatores de crise. Os preços das demais commodities minerais e agrícolas devem continuar se elevando. O Japão terá grandes dificuldades para continuar abastecendo o mercado mundial de componentes eletrônicos vitais para o funcionando da economia global altamente informatizada. Haverá uma parada obrigatória, mesmo momentânea, para a revisão dos projetos de energia nuclear, agravando os problemas produtivos em países, como a França, que possuem fortes cadeias industriais voltadas para esse setor.

Talvez por isso, com a França tendo uma forte indústria bélica, o governo Sarkozi tenha se mostrado tão belicista em relação à Líbia. Supõe, como os antigos imperialistas, que a guerra pode ser um instrumento de reativação econômica. Nem se deu conta de que os custos astronômicos dos atuais equipamentos bélicos vão agravar ainda mais a crise financeira da zona do euro. E que os custos de reconstrução das áreas destruídas pesarão consideravelmente, seja sobre os orçamentos já em crise, seja sobre a posição política desses falcões.

Por tudo isso, talvez possamos afirmar que os Estados Unidos, assim como seus aliados europeus, não estão em condições de transformar simpatia em projetos positivos. Para comprovar isso, basta examinar a posição dos Estados Unidos diante da tríplice tragédia japonesa. Eles estão sem qualquer condição de contribuir com qualquer ajuda financeira ou com a abertura de seus mercados. Depois, vão reclamar da China que, segundo muitos analistas, é a única que se acha em condições de oferecer uma ajuda financeira real ao Japão e abrir seu mercado para a recuperação das empresas e da economia japonesa.

O mesmo em relação ao Brasil. Mr. Obama quer maior abertura para os produtos norte-americanos, sem reduzir em nada os entraves à entrada da carne, etanol, sucos, algodão e outros produtos brasileiros no mercado norte-americano. Também não quer equilibrar a balança comercial entre os dois países. Mas Mr. Obama ofereceu financiamentos de um bilhão de dólares, como se estivesse ofertando a maior fortuna do mundo.

A presidenta Dilma poderia ter dito a ele que o Brasil está financiando os Estados Unidos em cerca de 8 bilhões de dólares anuais, que é o saldo dos EUA no comércio com o Brasil. Também poderia ter dito que os chineses, apenas para a exploração do pré-sal, financiaram 10 bilhões de dólares. Talvez não o tenha feito, por educação. E também porque, afinal, mesmo não pagando nem o cafezinho, a simpatia do casal Obama é inegável.

Por
Valter Pomar, publicado no sítio da Agência Latinoamericana de Informação (Alai)

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