O investimento da União e das estatais federais subiu pelo sétimo ano seguido em 2010, atingindo perto de 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo números da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda. O volume investido é um pouco superior aos 3,26% do PIB de 2009 e mais que o dobro do 1,59% do PIB registrado em 2003. As inversões do governo federal tiveram um impulso mais significativo em 2006, ganhando fôlego nos anos seguintes com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de 2007.
Entre as estatais, o grande destaque é a Petrobras, que, sozinha, investiu o equivalente a 2,03% do PIB nos 12 meses até outubro. É quase 70% a mais que o 1,21% do PIB investido pela União nos 12 meses até novembro de 2010. Uma pequena parte dos investimentos da Petrobras é feita fora do país, em torno de 5% do total.
Nesse quadro, a União e as estatais federais responderam por 17,9% do total investido na ampliação da capacidade produtiva no ano passado, considerando que a formação bruta de capital fixo (FBCF, medida das contas nacionais do que se investe na construção civil e em máquinas e equipamentos) ficou em 19% do PIB em 2010 e a Petrobras faz 95% das inversões dentro do país. Em 2009, a fatia federal no investimento total havia sido um pouco maior – 18,7% de uma formação bruta de capital fixo de 16,9% do PIB.
Isso ocorreu porque, com a crise global, as inversões públicas se ampliaram no momento em que o setor privado se retraiu. Os números de 2009 e 2010 mostram que houve mudança significativa da participação da União e das estatais no investimento total em relação aos anos anteriores. Em 2003, ano de forte ajuste fiscal, a fatia foi de 10%. Mesmo em 2008, quando o investimento público já estava em recuperação, não chegou a 13,5%.
As inversões do governo federal ganham força a partir da segunda metade da década, depois de alguma recuperação esboçada em 2004 e 2005. O professor Francisco Luiz Lopreato, da Unicamp, diz que houve uma mudança de orientação na política econômica a partir de 2006, abrindo espaço para uma elevação mais consistente do investimento público.
Entre outras medidas, ele lembra que o governo lançou o PAC e fortaleceu as estatais e os bancos públicos, como o BNDES, além de ter reduzido o superávit primário (a economia para pagar os juros da dívida) a partir de 2009, para combater os efeitos da crise global. Com isso, os investimentos federais atingiram um nível que já faz diferença para a atividade econômica, acredita Lopreato. “A visão se tornou mais desenvolvimentista a partir de 2006, com a saída de Antonio Palocci e a entrada de Guido Mantega na Fazenda.”
Para o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, houve uma percepção de que os investimentos precisavam se intensificar “desde 2007, com o PAC.” O problema, na visão de Vale, é que o “programa ainda não funciona efetivamente, com muita concentração em projetos da Petrobras e da Eletrobras “.
Ele reconhece a “tentativa de aceleração dos investimentos” a partir da crise global, mas observa que, mesmo com a alta recente, o volume de investimento público no Brasil é pequeno em relação ao dos outros emergentes, “onde, em geral, fica acima de 7% do PIB”. Se forem incluídas as inversões de Estados e municípios, o volume investido pelo setor público brasileiro em 2010 ficou em 5,1% do PIB, segundo números do Ministério da Fazenda.
Vale também vê com preocupação o fato de o volume de investimentos ser muito concentrado na Petrobras, que responde por quase 60% da soma de gasto da União e das estatais federais em 2010.
A análise das inversões da Petrobras ao longo da década mostra um salto impressionante a partir de 2002, quando a empresa passou a investir mais que a União. Em 2009, o volume investido pela companhia, equivalente a 1,97% do PIB, foi quase duas vezes superior ao 1,01% do investimento do governo federal. Para os próximos anos, a expectativa é que a empresa continue nessa trajetória, por conta da exploração do petróleo na camada pré-sal.
O economista Cláudio Fritschak, presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios, diz que houve um esforço nos últimos anos para aumentar o investimento público, mas também considera muito baixo o volume destinado à infraestrutura. Ele estima que, entre 2008 e 2010, o país investiu no setor, somando recursos públicos e privados, uma média anual de 2,42% do PIB, abaixo dos 3% do PIB que seriam necessários para evitar a degradação do estoque de capital já existente.
Para Frishtak, enfrentar a questão fiscal é decisivo para elevar os recursos para a infraestrutura, por dois motivos. O primeiro é controlar o ritmo de alta dos gastos correntes (pessoal, aposentadorias, custeio da máquina) para abrir espaço para o investimento público crescer mais. O outro é permitir uma redução dos juros que facilite a criação de um mercado de títulos privados de longo prazo, importante para desenvolver alternativas para financiar o investimento por períodos dilatados.
Um dos principais desafios do governo neste ano será manter em alta a trajetória do investimento num quadro de ajuste fiscal. Se quiser buscar a todo custo a meta de superávit primário de 3,1% do PIB, será necessário sacrificar investimentos, dizem especialistas em contas públicas como Mansueto Almeida, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Para Vale, como os investimentos são prioridade para a presidente Dilma Rousseff, não deverá haver corte das inversões, que tenderiam a continuar a crescer acima da variação do PIB. Uma das consequências é que a meta fiscal não deverá ser cumprida, acredita ele.
Por Sergio Lamucci – Valor Econômico
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